A difícil arte do perdão

Vivemos em uma sociedade cruel, egoísta e vingativa, e isso se reflete em todos os nossos relacionamento, inclusive na Igreja (infelizmente).

Estava procurando um texto sobre perdoar e esquecer, e encontrei um muito bacana... acredito que será útil para você, como foi para mim.

Fonte: Aleteia
Autor: Carlos Padilla Esteban

Precisamos aprender a perdoar, mas esquecer a ofensa não é imprescindível

Somos terra sagrada. Mas muitas vezes experimentamos nossa incapacidade para reconciliar-nos, para estar em paz com os outros, com Deus, conosco mesmos. Queremos um coração de criança, um coração limpo, renovado, enamorado.

É um tempo para pedir perdão e para perdoar, para estar em paz com Deus, para perdoarmos a nós mesmos pelas nossas quedas. É um tempo de graça que estamos vivendo. O céu se abre. Chove misericórdia de Deus.

Alguns dizem que não há verdadeiro perdão se não houver esquecimento das ofensas; que é impossível perdoar de verdade quando continuamente voltamos à ferida e alimentamos o rancor; que só esquecendo a ofensa é possível recomeçar.

Mas todos nós sabemos que há lembranças que não se apagam jamais, experiências que ficam gravadas na alma para sempre. A memória guardada no coração nos faz reviver tudo o que acreditávamos já ter esquecido.

Por isso, é necessário diferenciar perdão de esquecimento. Muitas vezes, eles não caminham juntos. Perdoar sempre nos cura. Na verdade, é a única coisa que cura o coração. Perdoar e ser perdoados.

Perdoar é uma graça de Deus, porque humanamente é muito difícil conseguir isso. Quantas vezes nos confessamos incapazes de perdoar quem nos ofendeu! Com quanta frequência percebemos a existência de alguns rancores enterrados na alma, que tiram nossa paz e alegria!

O perdão nos faz levantar-nos e empreender um novo caminho. Reconcilia-nos com a vida, com o mundo, conosco mesmos. Ele nos dá luz, alivia a carga.

O passar dos anos nos deixa feridas na alma. Há ofensas não perdoadas no coração. Precisamos pedir a graça do perdão. Ganha mais quem perdoa que quem é perdoado. Porque, ao perdoar, ficamos mais leves, mais livres. O perdão cura. Perdoar é uma graça de Deus.

Há sentimentos que nos impedem de perdoar. O orgulho, o pensar que temos a razão, o considerar-nos mais importantes do que somos, o fato de exagerar o tamanho da ofensa.

Sentimos que, se perdoarmos, não estaremos dando valor ao que aconteceu. Achamos que somos melhores que os que nos ofenderam, e perdoar nos faz voltar a colocar-nos à sua altura. Por isso, queremos que o outro se humilhe, aprenda uma lição, mude, não volte a ofender.

O perdão está condicionado a uma mudança de atitude de quem perdoa. Perdoamos se o outro se humilha. Perdoamos se o outro compensa o dano causado. Perdoamos se o outro reconhece sua culpa e se torna pequeno. Perdoamos se o outro se compromete a não voltar a fazer a mesma coisa.

Não é fácil perdoar incondicionalmente. Quando colocamos condições para perdoar, pode ser que nunca cheguemos a perdoar totalmente. Sempre resta um resquício para que o rancor entre. Uma porta aberta à amargura, à rejeição.

O perdão é fundamental para viver com paz, para semear alegria, para abrir janelas de luz. O perdão aos outros e a nós mesmos.

Quais são os rancores que você carrega no coração? Neste momento de graça, o que você quer perdoar? Qual é o nome do seu perdão?

Não acho que o esquecimento seja algo tão simples. Na verdade, penso que ele quase nunca é possível. Aquelas feridas do coração, os rancores que nos pesam, são experiências não esquecidas. Como esquecer aquilo que nos marcou para sempre? É realmente muito difícil. Faz parte da nossa história de amor. É como esquecer algo que nos constitui. É parte da nossa própria identidade.

Quando esquecemos, costuma ser porque a ferida foi superficial e a ofensa não foi tão grande. São experiências negativas que ficaram perdidas no passado e não lhes demos muita importância.

A memória é nossa bagagem de mão, sempre vai conosco. E nos serve para enfrentar a vida, para aprender do passado, para conhecer nossa história e agradecer, oferecer o que Deus nos deu. A memória nos ajuda a ir além dos preconceitos que a dor constrói. Precisamos perdoar. Mas esquecer não é imprescindível.

Lembro das feridas da minha vida. Algumas sangram às vezes. São parte do meu caminho. Lembro o dia, o momento. Se começo a recordar, chega a doer. Perdoei, mas continua doendo. Não esqueço do que aconteceu. Mas isso não é tão necessário. Além disso, não é algo que controlo. Por mais que eu queria formatar minha memória, não consigo.

Então, se não posso esquecer, o que posso fazer é que essas lembranças não determinem minha forma de tratar quem me ofendeu. Não posso fechá-lo em sua falta e pensar que sempre vai fazer a mesma coisa. Não posso condicionar minha atitude diante dele, meu carinho ou minha rejeição.

Não posso tratá-lo com certo desprezo ou distância. Não posso desconfiar eternamente das suas intenções e pensar que não vai mudar. Não posso julgá-lo e afastar-me da sua presença. Não posso desejar que ele sofra o que eu mesmo sofri. Preciso construir sobre essa rocha, sobre a minha história.

Não posso fazer a lembrança desaparecer. Mas posso decidir como agir, como tratar quem deus coloca em meu caminho novamente, como vou confiar nele, ainda que já tenha me falhado. Não é fácil, mas é o caminho da paz e da unidade.

Quantas divisões se tornam profundas porque não sabemos recomeçar! Quantas vezes a unidade não é possível porque nos falta humildade para perdoar! Falta coragem para tratar o outro como se nada tivesse acontecido, sem recordar-lhe continuamente o que ele fez, sem jogar na cara suas misérias.

Há pontos da nossa história que são difíceis. Feridas que não acabamos de aceitar. Coloquemos tudo nas mãos de Deus e de Maria. 

Não se pode esquecer, mas é possível recomeçar.

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Veja também:
- Já fui longe demais?
- Uma palavra que não está na Bíblia
- O que é a ANGÚSTIA DE JACÓ?



Comentários

Cacau disse…
Estava precisando ler sobre perdão! Perdoar não significa esquecer... Seria ótimo se existisse um efeito de esquecer tudo que nos machucou um dia e que de certa forma traz consequências para nossa vida. Mas esquecer é impossível, por isso perdoar é uma das coisas mais difíceis para um ser humano. Mas sem dúvidas, perdoar faz bem para o coração, traz alívio, tira um peso na consciência. Perdoar é um "remédio"... Estou no processo de tentar perdoar algo que me atingiu tanto, a ponto de toda minha vida até agora, ter consequências disso... Por várias vezes, pensei ter perdoado, mas se me atinge ainda e se lembro ainda tenho mágoas e raiva, acho que não perdoei ainda! Mas vou orar... Todo mundo precisa perdoar, porque um dia pode precisar do perdão de alguém também, além do perdão de Deus!

Gostei muito da matéria! Tudo que precisava ler, estava aí...
Professor Gilson,

Excelente post.
Perdoar nunca é fácil e o texto mostra bem que esse ato tirará um peso excessivo que carregamos desnecessariamente.

"Por isso, é necessário diferenciar perdão de esquecimento."
É algo que preciso aprender.
A.K.Renovatto disse…
Excelente o texto sobre perdão! No meio cristão se fala tanto em perdão, no entanto, vemos que muitos cristãos têm uma grande dificuldade em perdoar. Isso me faz pensar que mais do que falar, devemos colocar em prática o que tanto ouvimos e lemos sobre perdão. Vive melhor quem sabe pedir/liberar o perdão.

"Suportem-se uns aos outros e perdoem as queixas que tiverem uns contra os outros. Perdoem como o Senhor lhes perdoou. " (Cl 3.13)